Indiferença
na Liderança: O Custo Silencioso Que Afasta Talentos nas Empresas Brasileiras
1.
Introdução:
Em
sua obra “Great Leaders Make People Feel Noticed”, Zach Mercurio defende que o
verdadeiro diferencial de um grande líder não está em sua autoridade ou
conhecimento técnico, mas em sua capacidade de fazer com que as pessoas ao seu
redor se sintam vistas, valorizadas e reconhecidas. Para ele, líderes
memoráveis são aqueles que cultivam a atenção genuína, enxergam o ser humano
por trás do cargo e praticam a empatia como ferramenta estratégica de gestão.
Não se trata de bajulação, mas de presença: líderes eficazes são aqueles que
reconhecem a existência e a importância de cada colaborador de forma autêntica
e constante.
Mercurio
desafia a lógica tradicional da liderança centrada apenas em metas e
resultados, e propõe uma abordagem humanizada e intencional, onde o ato de
notar alguém pode ser mais transformador do que qualquer política de bônus ou
plano de carreira. Em um mundo cada vez mais impessoal e automatizado, ele nos
lembra de uma verdade fundamental: as pessoas não precisam ser lembradas de sua
importância — elas já são importantes. O que falta, muitas vezes, é alguém que
realmente as enxergue. Essa mudança de olhar é o que separa um chefe comum de
um líder inesquecível.
A
Liderança Ausente: Quando o Chefe Só Aparece para Apontar o Dedo
Em
contraste com a visão humanizada de Zach Mercurio, o que se observa em muitas
empresas brasileiras é um modelo de liderança ultrapassado, autoritário e
indiferente. Não é raro encontrar líderes que não conhecem a realidade do chão
de fábrica, não circulam pelos setores, sequer sabem o nome de quem está na
linha de frente. Permanecem trancados em salas com ar-condicionado, distantes
dos problemas reais e das pessoas que enfrentam os desafios diários. Para esses
líderes, o relacionamento com a equipe se resume a cobranças por resultado e
presença em reuniões — quase sempre voltadas para apontar falhas e impor metas,
nunca para ouvir ou reconhecer.
Esse
tipo de liderança só dá as caras quando surgem crises — e mesmo nesses
momentos, sua presença não significa apoio, mas sim pressão, bronca e clima de
medo. Ao invés de colaborar na busca por soluções, surgem para responsabilizar
os outros, ignorando completamente os fatores que levaram aos problemas. O
ambiente, já fragilizado pela falta de diálogo e reconhecimento, se torna ainda
mais hostil, criando uma cultura de insegurança e desvalorização. Nesse
cenário, as pessoas trabalham por obrigação, não por propósito; obedecem por
medo, não por respeito. É exatamente o oposto da liderança que inspira e
transforma.
“Se
grandes líderes fazem as pessoas se sentirem notadas, o que dizer daqueles que
fingem que elas não existem?”
Essa
pergunta ecoa nos corredores de muitas empresas brasileiras, onde o silêncio da
liderança se tornou regra. Há gestores que passam dias — até semanas — sem
dirigir uma palavra à equipe, sem perguntar como estão, sem sequer olhar nos
olhos de quem executa o trabalho que sustenta os resultados da empresa. O que
isso comunica? Que o colaborador é apenas mais uma peça substituível na
engrenagem. A ausência de reconhecimento não é neutra: ela machuca, desmotiva e
corrói a relação entre o time e a liderança.
Ignorar
alguém no ambiente de trabalho é uma forma silenciosa de desprezo. É como
dizer, sem palavras: "Você não importa." Esse comportamento mina o
senso de pertencimento e sufoca qualquer possibilidade de engajamento genuíno.
Quando o colaborador percebe que seu esforço não é visto, que sua presença
passa despercebida, ele começa a se calar, se retrair e, por fim, se desligar
emocionalmente, mesmo que continue batendo o ponto todos os dias. Liderar é,
acima de tudo, enxergar. E quando um líder se recusa a ver, ele não está apenas
falhando com sua equipe — está abrindo caminho para a perda silenciosa dos
melhores talentos.
2. O
que é “notar” alguém no ambiente de trabalho?
Notar
alguém no ambiente de trabalho, segundo Zach Mercurio, vai muito além de um
simples “bom dia” ou de elogios genéricos. Trata-se de um ato intencional de
enxergar a pessoa em sua totalidade, reconhecendo não apenas o que ela faz, mas
quem ela é. É prestar atenção nos detalhes: perceber o esforço silencioso,
valorizar as pequenas conquistas, escutar com presença genuína. Notar é
comunicar, com atitudes, que o indivíduo tem importância real dentro da
organização — que ele não é invisível, e que sua contribuição tem valor.
Esse
tipo de reconhecimento não precisa de grandes discursos ou premiações; muitas
vezes, está em um olhar atencioso, uma escuta sincera, um agradecimento
espontâneo ou uma pergunta que demonstra interesse verdadeiro. Para Mercurio,
quando líderes se dispõem a notar de verdade, criam conexões humanas que
fortalecem o ambiente, geram pertencimento e ativam o melhor que cada
colaborador tem a oferecer. Notar é humanizar. É transformar o local de
trabalho em um espaço onde as pessoas não apenas produzem, mas sentem que
existem — e que são vistas.
3. A
realidade no Brasil: a cultura do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”
A
cultura do “manda quem pode, obedece quem tem juízo” ainda impera em muitas
empresas brasileiras, onde o modelo de chefia autoritária é mantido como se
fosse sinônimo de eficiência. Ainda hoje, é comum encontrar gestores que não
aparecem no dia a dia da equipe, a não ser para criticar ou encontrar erros no
trabalho dos subordinados. São chefes que se escondem atrás de suas agendas
lotadas, que não descem até o operacional, que nunca têm tempo quando são
procurados — e, quando aparecem, deixam um rastro de tensão e desconforto.
Nesses ambientes, o respeito é substituído pelo medo, e o silêncio reina por
falta de abertura verdadeira ao diálogo.
Esse
tipo de liderança não apenas desmotiva, como também sabota o desempenho
coletivo. Os funcionários aprendem, com o tempo, a não esperar apoio, não
buscar orientação e não confiar em quem deveria ser referência. O chefe se
torna uma figura ausente — ou pior, uma ameaça —, o que gera uma cultura de
sobrevivência, e não de colaboração. Conheço vários profissionais que vivem
essa realidade: trabalham com receio constante, se sentem desamparados e
carregam o peso de decisões sem qualquer suporte. O resultado é um ambiente
engessado, marcado pela desconfiança, pelo retrabalho e pela perda contínua de
talentos que buscam, acima de tudo, respeito e reconhecimento.
4. Os
efeitos dessa liderança tóxica e indiferente
Os
efeitos de uma liderança tóxica e indiferente são profundos e silenciosos.
Quando o colaborador percebe que não é ouvido, valorizado ou sequer notado, ele
começa a se desligar emocionalmente da empresa. Isso se traduz em queda de
produtividade, perda de entusiasmo e um sentimento constante de frustração. A
motivação deixa de ser o orgulho pelo que se faz e passa a ser o simples medo
de perder o emprego. Nesse cenário, a criatividade desaparece, o engajamento
evapora e a cultura organizacional se deteriora. Ambientes assim se tornam
frios, apáticos e, com o tempo, até hostis.
Além
disso, esse tipo de liderança impulsiona o aumento da rotatividade.
Profissionais competentes e promissores não permanecem em locais onde não se
sentem vistos ou respeitados. A organização, então, passa a conviver com altos
custos de contratação, treinamento e adaptação de novos colaboradores, sem
perceber que o problema não está nos funcionários que saem, mas nos líderes que
afastam. Esse ciclo de perda constante compromete a continuidade dos processos,
gera insegurança entre os que ficam e impede o amadurecimento de uma cultura
forte e saudável. Em resumo, uma liderança indiferente custa caro — em capital
humano, em clima organizacional e em resultados.
5. O
que as empresas precisam aprender com Zach Mercurio
O
pensamento de Zach Mercurio traz uma lição urgente que muitas empresas
brasileiras ainda ignoram: liderança é, acima de tudo, um ato de humanidade. As
organizações precisam compreender que os resultados não nascem de cobranças
vazias, mas de vínculos verdadeiros entre líderes e suas equipes. Notar as
pessoas, como Mercurio propõe, não é um gesto simbólico ou supérfluo — é
estratégico. Empresas que investem em líderes capazes de enxergar o outro de
forma genuína constroem ambientes mais estáveis, colaborativos e inovadores,
onde as pessoas se sentem pertencentes e motivadas a dar o seu melhor.
É
preciso abandonar o velho modelo de liderança baseado em medo e distanciamento,
e adotar uma postura mais empática, próxima e intencional. Os líderes devem ser
treinados para desenvolver escuta ativa, reconhecimento sincero e presença real
no cotidiano das equipes. Aprender com Zach Mercurio significa assumir que os
resultados mais consistentes vêm de pessoas que se sentem vistas, ouvidas e
respeitadas. Quando uma empresa cria essa cultura, ela não apenas melhora seu
desempenho — ela se torna um lugar onde as pessoas querem ficar, crescer e
contribuir de verdade.
6. Um
Chamado à Reflexão: O Legado Que Você Constrói
O
Brasil não pode mais se dar ao luxo de manter uma liderança desconectada. As
empresas que insistem em modelos hierárquicos e indiferentes não apenas perdem
talentos, mas sacrificam a inovação, a criatividade e a própria
sustentabilidade a longo prazo. É chegada a hora de questionar as velhas
práticas: se o sucesso de uma organização depende intrinsecamente das pessoas
que a compõem, por que tantos líderes ainda agem como se elas fossem
invisíveis? A resposta a essa pergunta é o ponto de partida para a verdadeira
transformação.
A
escolha está nas mãos de cada líder e de cada empresa. Continuar no caminho da
indiferença é aceitar o custo invisível e progressivo de equipes desengajadas,
alta rotatividade e uma cultura de medo. Ou, então, abraçar a filosofia de Zach
Mercurio, investindo na humanização da gestão e reconhecendo que cada "bom
dia" sincero, cada escuta atenta e cada olhar que "nota" alguém
são atos poderosos. Afinal, as pessoas se lembrarão não apenas do que você
disse, mas, acima de tudo, de como você as fez sentir.
7. Um
Novo Rumo: Liderança Que Transforma
A
indiferença tem um custo, e as empresas brasileiras não podem mais ignorá-lo. É
hora de reconhecer que investir na capacitação emocional de líderes não é um
luxo, mas uma necessidade estratégica. Isso significa ir além das habilidades
técnicas e focar no desenvolvimento da empatia, da escuta ativa e da capacidade
de se conectar genuinamente com as pessoas. Uma liderança emocionalmente
inteligente é a base para ambientes de trabalho onde a confiança floresce, a
comunicação é clara e o engajamento se torna uma realidade diária. Esse é o
caminho para construir equipes não apenas produtivas, mas também resilientes e
satisfeitas.
Para
que essa transformação seja duradoura, a forma como avaliamos nossos líderes
precisa mudar radicalmente. Não basta focar apenas em resultados financeiros ou
metas operacionais; é fundamental que a avaliação da liderança inclua seu
impacto humano. Perguntas como "Meu líder me faz sentir valorizado?",
"Ele se preocupa com meu desenvolvimento?" ou "Sinto-me seguro
para expressar minhas ideias?" devem ser tão importantes quanto os KPIs de
desempenho. Ao atrelar o reconhecimento e o crescimento dos líderes à sua
capacidade de inspirar e engajar, as organizações sinalizam que as pessoas são,
de fato, seu ativo mais valioso.
A
mudança começa em cada um de nós. Se você é um líder, comece agora mesmo, com
pequenas ações diárias que fazem uma grande diferença. Escute mais do que fala,
buscando entender as perspectivas e desafios de sua equipe. Agradeça
genuinamente o esforço e a dedicação, reconhecendo publicamente ou em
particular. E, acima de tudo, esteja presente: olhe nos olhos, conheça os nomes
e demonstre interesse real. Lembre-se, o legado de um líder não é medido apenas
pelos números que ele atinge, mas pela forma como ele transforma a vida das
pessoas ao seu redor. Qual é o legado que você deseja deixar?